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Genealogista resgata e seca papéis históricos que documentam a imigração no RS

O que um cartório tem? As pilhas de documentos antigos guardam a história de um país. Estão lá os nascimentos, os óbitos, as transações envolvidas na aquisição de um imóvel e o registro da chegada dos primeiros estrangeiros que escolheram o Brasil como lar.

É toda essa memória, muito particular da vida civil, que corre risco de ser levada pelas águas que inundam o Rio Grande do Sul, justamente o estado que recebeu levas de imigrantes europeus oriundos de Alemanha e Itália, só para citar algumas nações, em diferentes momentos da história.

Um desses cartórios já tragados pela água é o do distrito de Galópolis, na região de Caxias do Sul (RS). O desmoronamento do prédio, com toda documentação centenária, deixou Nátali Lazzari em pânico.

Especialista em genealogia e obtenção de cidadania italiana, Nátali está acostumada a reunir todo tipo de documentação para ajudar seus clientes a montar processos de reconhecimento de dupla nacionalidade.

Os documentos atuais do cartório estão garantidos em arquivos em “nuvem”. Mas não os antigos. Numa conversa com o oficial do cartório, ambos tiveram uma ideia: resolveram alugar uma sala para a montagem de uma operação de secagem dos livros de registros atingidos pela inundação e que conseguiram ser resgatados.

“Quase 400 livros foram levados para a sala alugada porque o cartório virou pó. E, mesmo em condições improvisadas, estamos tentando salvar o que dá. Começamos a secar os livros do registro civil, onde estão não apenas histórias das famílias, desde 1914, quando vieram os primeiros imigrantes para esta área. Estamos ajudando que parte da história do Brasil não se apague”, conta ela, em entrevista ao InfoMoney.

Segundo Nátali, parte dos documentos foram digitalizados e armazenados em um HD que ficava dentro do cartório, mas se perdeu com a subida da água. “Encontramos uma realidade de guerra”, ressalta.

‘Páginas de barro’

O trabalho de recuperação é minucioso. É preciso retirar o barro de página por página, com cuidado para não rasgar o material antigo. Ventiladores ficam posicionados diante dos livros para secar o papel antes do início da deteriorização por fungos.  “Foi uma luta insana, mas agora eles estão praticamente secos e vamos terminar a limpeza”, explica.

Natural de Garibaldi, Nátali trabalha há 10 anos com processos de cidadania e afirma que a inundação criou um problema ainda maior na preservação dos únicos registros que haviam, por exemplo, nas paróquias católicas, que também estão debaixo d´água. “Registros antigos de casamentos, batizados e histórias de todo um povo estão sendo perdidos. O que sobrou, as pessoas não sabem nem manusear direito para recuperar”, afirma, acrescentando que cartórios como o de Garibaldi, que tinha um acervo importante de imigrantes, e de Bento Gonçalves não têm mais registros antigos, porque foram perdidos em outras enchentes. “Fiquei assustada quando vi uma pilha de certidões de casamento amontoadas ainda molhadas num saco. Comecei a espalhar pelo chão para que elas ‘respirassem’. Dava para ler os arquivos, mas os funcionários, por falta de conhecimento, poderiam botar tudo a perder”, diz ela.

Toda essa preocupação tem objetivo: manter o registro histórico dos imigrantes e garantir a possibilidade de os descendentes reconstruírem suas histórias. “Quando montamos um processo, entendemos como essas pessoas ajudaram a construir o Brasil, recuperando tudo que trouxeram na bagagem da Europa.”

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