Os dados de inflação nos EUA abaixo do esperado em maio – o CPI divulgado hoje mostrou estabilidade da leitura mensal e um ligeiro recuo na comparação anual – trouxeram algum alívio com relação às suspeitos de uma reaceleração de preços, segundo os economistas, mas ainda não devem ser suficientes para dar ao Federal Reserve (Fed, o banco central americano) segurança suficiente para começar a cortar os juros no curto prazo.
Análises sobre os componentes do indicador ainda apontam pressões vindas de serviços, como os ligados à habitação e à saúde, e também patamares elevados e longe da meta de 2% tanto do índice cheio como de seus núcleos.
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André Valério, economista sênior do Inter, comenta que a inflação de serviços foi mais uma vez o grande fator de alta, contribuindo com 0,13 ponto percentual para o resultado cheio, ainda refletindo a inflação de habitação, que desacelera de maneira mais gradual que o antecipado. Ele pondera que tal alta foi totalmente compensada pela deflação em energia, que retirou 0,14 ponto percentual do índice cheio.
O economista destaca que o chamado supernúcleo, que exclui do núcleo da inflação de serviços os gastos com habitação – medida acompanhada de perto por Jerome Powell e os demais diretores do Fed – apresentou variação negativa de 0,04%.
Essa métrica agora acumula alta de 4,7% nos últimos 12 meses, abaixo dos 4,9% observados em abril, na primeira desaceleração dessa medida desde dezembro.
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“O resultado [do CPI] vem na direção que o Fed gostaria e deve dar maior tranquilidade para a reunião de hoje. De modo geral, foi um resultado bem ameno, com as tendências de altas sendo revertidas, tanto na média móvel de 6 meses quanto na de 3 meses, reduzindo os temores de uma reaceleração inflacionária.”
Para Valério, o único ponto de atenção continua sendo a inflação de habitação, que mantém tendência de desaceleração no acumulado em 12 meses, mas que acelerou na comparação mensal. Isso, juntamente a um mercado de trabalho aquecido, “pode se mostrar um entrave ao processo de desinflação. Ainda assim, com o dado de hoje, mantemos nossa expectativa de início do ciclo de cortes nos juros americanos na reunião de setembro.”
Habitação e saúde
Na opinião de Matheus Pizzani, economista da CM Capital, além de ter sido uma surpresa positiva em termos numéricos, o dado de maio ajudou a tornar ainda mais claro alguns dos pontos de estrangulamento remanescentes no processo de desinflação dos Estados Unidos. “Sem qualquer tipo de surpresa, se concentram todos no núcleo do indicador”, afirma.
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Pizzani lembra que, embora não seja o indicador oficialmente acompanhado pelo Fed, alguns itens do CPI são monitorados pelos membros do comitê de política monetária da instituição. “Como os preços de energia elétrica, que em maio não registraram variação, reforçando a característica positiva do indicador”, diz, destacando que tinha sido registrada um queda em abril.
No caso do núcleo do indicador, o economista aponta que a desaceleração de 0,3% para 0,2% entre abril e maio foi motivada majoritariamente pelo comportamento dos preços de serviços, com destaque para os preços dos serviços de transporte, que recuaram 0,5%.
“O grupo de habitação manteve seu resultado estável em 0,4% pela quarta leitura consecutiva. Desde o mês de novembro, apenas em fevereiro (+0,6%) o grupo deixou de apresentar variação desta magnitude, tendo seu resultado acumulado em 12 meses rodando sempre acima dos 5%, sendo este um dos principais pontos de estrangulamento supracitados e que devem motivar a permanência dos juros em patamar elevado por mais algum tempo.”
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Outro ponto importante destacado por Pizzani diz respeito aos preços que envolvem todo a cadeia do setor de saúde do país. No caso do CPI, houve alta de 0,5% nos preços de serviços médicos, com crescimento de mesma magnitude sendo observado pelos serviços hospitalares e alta de 2,1% nos medicamentos.
“Além de contribuições inflacionárias diretas, esta cadeia de serviços tem pressionado simultaneamente o mercado de trabalho do país, sendo um dos principais responsáveis pelas altas recentes do payroll e pelo crescimento dos rendimentos dos trabalhadores do país”, explica.
O economista argumenta que os juros elevados, no entanto, deverão seguir como resposta ao quadro, uma vez que para conviver com uma inflação mais elevada no setor de saúde enquanto se resolvem as questões estruturais, o Fed deverá buscar um desaquecimento mais intenso de outros grupos que são efetivamente impactados por sua política.
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“Em suma, o dado do CPI divulgado hoje veio em boa hora, ajudando a acalmar parcialmente o mercado após o payroll mais forte divulgado na semana anterior. A característica majoritariamente positiva, caso confirmada pelo PCE, tende a colaborar no sentindo de criar um ambiente propício para o processo de flexibilização monetária no país, que segue tendo o segundo semestre como referência.”
Claudia Rodrigues, economista do C6 Bank, pondera que, apesar do alívio no mês, o indicador ainda mostra uma desaceleração lenta da inflação, longe de sinalizar uma convergência para a meta do Federal Reserve, de 2%.
“O cenário continua sendo de mercado de trabalho aquecido e renda elevada, que mantêm o consumo forte e pressionam os preços. Vários indicadores de núcleos de inflação, inclusive os divulgados pelo Fed, mostram que o aumento de preços está estabilizando perto de 3%, ou seja, em um patamar elevado”, alerta.
O C6 Bank mantém sua visão de que o Fed não deve começar a cortar juros este ano, preferindo esperar por mais evidências de desaceleração da inflação. “Nossa projeção é que a taxa de juros americana fique no patamar atual de 5,25% a 5,5% até o final de 2024.”
Ashwin Alankar, gerente de portfólio na Janus Henderson, por sua vez, acredita que o CPI suave de hoje coloca o Fed de volta no controle para direcionar um corte preventivo ainda este ano para garantir que a recessão permaneça distante.
“Neste estágio, não há objetivo maior do que a credibilidade do Fed para manter as expectativas de inflação ancoradas, a atividade econômica robusta e os mercados financeiros amigáveis. Até que maiores evidências de desinflação sejam vistas tanto em amplitude quanto em profundidade, a suavidade de hoje é favorável a um corte preventivo, em vez de uma mudança na política do Fed em direção à acomodação.”