O presidente da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), Edegar Pretto, anunciou, nesta terça-feira (11), a anulação do leilão realizado pela instituição em 6 de maio e cancelou a compra de 263,3 mil toneladas de arroz que seriam importadas.
A decisão foi comunicada em conjunto com os ministros da Agricultura e Pecuária (Mapa), Carlos Fávaro (PSD), e do Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA), Paulo Teixeira (PT), e foi tomada em meio a indícios de incapacidade técnica e financeira de algumas empresas vencedoras do processo. Agora, o governo trabalha em um novo certame com ajustes de procedimentos.
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Segundo Fávaro, a avaliação do governo é que, do conjunto das empresas vencedoras do leilão, uma maioria tem “fragilidades”, ou seja, “não tem capacidade financeira de operar um volume financeiro desse tamanho”. Três das quatro vencedoras do certame não são do ramo de importação do alimento − o que poderia trazer problemas de operação.
As mais de 260 mil toneladas de arroz arrematadas correspondem a 87% das 300 mil toneladas autorizadas pelo governo nesta primeira operação. No total, mais de R$ 7 bilhões foram liberados para a compra de até 1 milhão de toneladas. O ministro reforçou, no entanto, que nenhum recurso chegou a ser transferido na operação.
As empresas participam do leilão representadas por corretoras em Bolsas de Mercadorias e Cereais e só são conhecidas após o certame. A ideia agora é que um novo edital seja publicado com mudanças nos mecanismos de transparência e segurança jurídica. Mas ainda não há data para um novo leilão.
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O episódio também gerou críticas pelo fato de o diretor de Abastecimento da Conab, Thiago dos Santos, responsável pelo leilão, ser indicado por Neri Geller, que nesta terça-feira (11) pediu exoneração do cargo de secretário de Política Agrícola do Mapa. Opositores apontam para suspeitas de um possível favorecimento no leilão. Isso porque a FOCO Corretora de Grãos, principal corretora do leilão, pertence ao empresário Robson Almeida de França, que foi assessor parlamentar de Neri Geller na Câmara dos Deputados e é sócio de Marcello Geller, filho do político, em outras empresas.
Na conversa com os jornalistas, Fávaro confirmou que aceitou o pedido de demissão, mas destacou que Marcello Geller estabeleceu a sociedade com Robson Almeida de França no momento em que o pai não era secretário de Política Agrícola. O ministro também disse que a empresa em questão não participou do leilão e não fez nenhuma operação relacionada.
Veja o que se sabe até o momento sobre o caso em XX perguntas:
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1. Qual era o objetivo do leilão?
O objetivo da importação do arroz é garantir o abastecimento e estabilizar os preços do produto no mercado interno, que tiveram uma alta média de 14%, chegando em alguns lugares a 100%, após as inundações no Rio Grande do Sul em abril e maio deste ano.
O estado é responsável por cerca de 70% do arroz consumido no país. A produção local foi atingida tanto na lavoura como em armazéns, além de ter a distribuição afetada por questões logísticas no estado.
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De acordo com Fávaro, a diferença entre o que é produzido e o que é consumido no Brasil é muito apertada. “Ninguém disse que não tem arroz no Brasil, mas é muito justo. Ontem saíram dados da Serasa que preveem uma quebra de 500 mil toneladas [na produção]. Para aquilo que é justo, já ficar faltando. E é determinação do presidente que isso não reflita na mesa dos mais humildes é um alimento básico da população brasileira”, disse o ministro.
2. Quais seriam as condições de venda do produto?
O arroz importado seria vendido em pacotes de 5 quilos por um preço tabelado de R$ 20,00 − ou seja, R$ 4,00 o quilo (valor mais barato do que o normalmente observado nos supermercados) − e teria o rótulo com os logotipos da Conab e da União, além da mensagem: “Produto Adquirido pelo Governo Federal”.
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A previsão era de importação de 300 mil toneladas de arroz, com a entrega a ser realizada em três etapas: 1) 100 mil toneladas entre 10 de junho e 8 de setembro; 2) 100 mil toneladas entre 9 de setembro e 9 de outubro; e 3) as 100 toneladas restantes entre 10 de outubro e 8 de novembro.
3. Por que o leilão vem sendo criticado por produtores locais?
Associações de produtores rurais alegam que a iniciativa é intervencionista e desestimula a produção nacional de arroz. A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) chegou a ingressar com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI nº 7664) junto ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão, pedindo a suspensão do leilão.
Segundo a CNA, não há risco de desabastecimento, porque a quantidade de grãos já colhida antes das chuvas (84% da área plantada) seria suficiente para atender a demanda nacional. A entidade sustenta, ainda, que eventual risco de desabastecimento decorre de problemas de transporte e escoamento da produção − o que reforça a urgência na recuperação da infraestrutura viária no Rio Grande do Sul.
Por fim, a CNA diz que não houve planejamento apropriado para medida nem balanço das perdas efetivas e da situação dos estoques de grãos já colhidos no estado. Por isso, diz que a providência seria “equivocada, intempestiva, precipitada e confusa” e representaria uma violação dos princípios da livre iniciativa e da livre concorrência. A relatoria do caso foi distribuída ao ministro André Mendonça.
O governo, por sua vez, alega que o objetivo da medida é somente garantir que o preço do arroz não suba de forma expressiva ao consumidor, prejudicando sobretudo as famílias de baixa renda do País.
4. Quem são os vencedores do leilão anulado?
Três das quatro empresas que venceram o certame não atuam no ramo de importação de arroz, embora todas tenham o comércio de produtos alimentícios como atividade secundária. São elas: a Icefruit, uma fábrica de polpas de frutas de São Paulo; a Wisley A de Souza Ltda, uma loja de queijos de Macapá (AP); e a ASR Locação de Veículos e Máquinas, de Brasília.
Uma das polêmicas do processo envolve a loja de queijos Wisley A de Souza Ltda, que, dias antes do leilão, alterou no registro junto à Receita Federal seu capital social de R$ 80 mil para R$ 5 milhões. A empresa arrematou R$ 736 milhões no certame. O espaço desta reportagem está aberto para manifestações dos envolvidos no processo.
5. O que se sabe sobre o novo leilão?
A Conab chegou a convocar a Bolsa de Cereais e Mercadorias de Londrina e a Bolsa de Mercadorias do Mato Grosso para apresentarem as comprovações das empresas, após dúvidas e repercussões com o resultado do leilão. Os documentos exigidos são capacidade técnica dos arrematantes; capacidade financeira, com as demonstrações financeiras dos exercícios de 2022 e 2023; regularidade legal para enquadramento nas regras do leilão da Bolsa e dos arrematantes e participação dos sócios da Bolsa e dos arrematantes dos lotes em outras sociedades.
O governo vai, agora, construir um novo edital, com a participação da Controladoria-Geral da União (CGU) e da Advocacia-Geral da União (AGU) para que essa análise das empresas participantes ocorra antes da operação.
(com agências)