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Por que o AI Pin fracassou como dispositivo de inteligência artificial

Dias antes de os críticos de gadgets avaliarem o Humane AI Pin, um dispositivo vestível futurista movido por inteligência artificial, os fundadores da empresa reuniram seus colaboradores e avisaram que deveriam se preparar. As avaliações podem ser decepcionantes, alertaram.

E os fundadores da Humane, Bethany Bongiorno e Imran Chaudhri, estavam certos. Em abril, os avaliadores foram implacáveis com o novo produto de US$ 699 que a Humane promoveu durante um ano com anúncios e em eventos de destaque, como a Paris Fashion Week. Alguns avaliadores chegaram a afirmar que o AI Pin estava “totalmente quebrado” e que tinha “falhas gritantes”. Um chegou a dizer que era “o pior produto que já avaliei”.

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Cerca de uma semana após a publicação das críticas, a Humane deu início a conversas com a HP, um fabricante de computadores e impressoras, para negociar uma possível venda por mais de US$ 1 bilhão, de acordo com três fontes familiarizadas com as negociações. Outros potenciais compradores surgiram, embora as negociações tenham sido informais e nenhum processo formal de venda tenha sido iniciado.

Ai Pin da Humane, exibido na sede da empresa em São Francisco em 1º de abril de 2024. O Ai Pin deveria libertar as pessoas dos smartphones, mas as vendas têm sido lentas. Agora a Humane está conversando com a HP e outros sobre uma venda potencial. (Crédito: Andri Tambunan/The New York Times)

A Humane contratou o Tidal Partners, um banco de investimento, para auxiliar nas conversas e, ao mesmo tempo, gerenciar uma nova rodada de financiamento que avaliaria o gadget em US$ 1,1 bilhão, segundo três fontes que têm familiaridade com os planos.

Os desenvolvimentos representam um revés para Humane, que se posicionou como um dos principais concorrentes em uma onda de fabricantes de hardware de IA. A empresa de São Francisco arrecadou US$ 240 milhões de investidores influentes do Vale do Silício, incluindo o CEO da OpenAI, Sam Altman, e o CEO da Salesforce, Marc Benioff, que avaliaram a startup em US$ 1 bilhão devido à sua grande ambição e promessa. A Humane passou cinco anos construindo um dispositivo para revolucionar o smartphone, só para fracassar.

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A interface do Humane Ai Pin é projetada na palma da mão, em São Francisco, em 27 de outubro de 2023. Humane, uma empresa fundada por dois ex-funcionários da Apple, diz que seu novo pin de inteligência artificial pode interromper toda a rolagem. (Crédito: Kelsey McClellan/The New York Times)

No início de abril, ela havia recebido cerca de 10 mil pedidos do AI Pin, uma pequena fração dos 100 mil que esperava vender este ano, disseram duas fontes familiarizadas com suas vendas. Nos últimos meses, a empresa também enfrentou a saída de colaboradores e modificou sua política de devolução para lidar com cancelamentos de pedidos. Na quarta-feira, ela pediu aos clientes que parassem de usar o estojo de carregamento do AI Pin devido ao risco de incêndio associado à bateria.

Seus contratempos fazem parte de um padrão de tropeços no mundo da IA generativa, à medida que as empresas lançam produtos ainda não refinados. Nos últimos dois anos, a Google introduziu e depois reduziu suas capacidades de pesquisa de IA que recomendavam que as pessoas comessem pedras, a Microsoft lançou um chatbot do Bing que apresentava comportamentos alucinantes e a Samsung adicionou recursos de IA a um smartphone que foram descritos como “excelentes às vezes, desconcertantes em outras”.

Em uma entrevista, Bongiorno e Chaudhri, que são casados, não quiseram comentar sobre uma possível venda ou angariação de fundos para a Humane. Segundo eles, suas ambições para o AI Pin não mudaram, mas reconheceram que há uma diferença entre testar um dispositivo e de fato utilizá-lo.

“Você não sabe tudo antes de fazer o lançamento”, comentou Bongiorno. Segundo Chaudhri, dadas as críticas ao produto, eles “definitivamente gostariam que pudéssemos resolver algumas dessas coisas de maneira um pouco diferente”.

A HP não respondeu a pedidos por comentários.

Esta narrativa sobre a Humane é baseada em entrevistas feitas com 23 funcionários atuais e antigos, consultores e investidores, que pediram anonimato porque não estavam autorizados a falar publicamente sobre o assunto ou temiam retaliação. A Bloomberg já havia informado a respeito da potencial venda da startup.

Vários colaboradores atuais e antigos afirmaram que Chaudhri e Bongiorno valorizavam a positividade em detrimento das críticas, o que resultou na desconsideração de alertas sobre a curta duração da bateria e o alto consumo de energia do AI Pin. De acordo com eles, um engenheiro de software sênior foi demitido após levantar questões sobre o produto enquanto outros desistiram por frustração.

Chaudhri afirmou que sua empresa, que chegou a ter 250 funcionários, incentivava os colaboradores a fornecerem feedback. As saídas foram consequência natural da transição da criação de um novo dispositivo para sua manutenção após o lançamento, o que, segundo ele, demandava “um tipo diferente de pessoa”.

Chaudhri e Bongiorno, que trabalharam na Apple, fundaram a Humane em 2019. Eles decidiram desenvolver um pin de lapela que se fixa à roupa por meio de um ímã. O dispositivo dá aos usuários acesso a um assistente virtual equipado com tecnologia de IA que pode enviar mensagens, pesquisar na web ou tirar fotos. Ele é acompanhado por um laser que projeta texto na palma da mão do usuário para habilitar funções como pular uma música durante a reprodução. Possui também câmera, alto-falante e serviço de celular.

Colaboradores atuais e ex-colaboradores dizem que desde o início o AI Pin enfrentou os problemas que foram posteriormente identificados pelos avaliadores.

Um deles era o display laser do dispositivo, que consumia uma grande quantidade de energia e causava o superaquecimento do pin. Conforme três fontes familiarizadas com o assunto, antes de apresentarem o dispositivo a possíveis parceiros e investidores, os executivos da Humane frequentemente o resfriavam em bolsas de gelo para prolongar sua duração. Esses colaboradores comentaram que tais medidas são comuns no início do ciclo de desenvolvimento de produtos.

Os fundadores disseram que conversaram com vários avaliadores enquanto eles analisavam o dispositivo e respondiam a perguntas que surgiam a respeito de suas experiências, dentre as quais preocupações sobre a temperatura do AI Pin e respostas imprecisas a algumas solicitações.

Em 11 de abril, avaliações publicadas no The New York Times, The Wall Street Journal e no The Verge criticaram as deficiências do AI Pin. Marques Brownlee, um avaliador de tecnologia que tem 19 milhões de seguidores no YouTube, intitulou sua crítica “O pior produto que já analisei… por enquanto”.

Após as críticas, Bongiorno disse: “reunimos a equipe e dissemos: ‘OK, olha, isso será doloroso. Vamos ter que aceitar feedback doído”.

Bongiorno e Chaudhri afirmaram que a Humane já está lidando com os problemas do dispositivo. A startup incluiu mais opções de navegação por voz no dispositivo, juntamente com efeitos sonoros, para facilitar sua utilização. As atualizações incluem a integração do mais novo sistema de chatbot da OpenAI, o GPT-4o, e um que está configurado para melhorar a vida útil da bateria em 25% e reduzir o tempo de resposta do dispositivo para dois segundos.

Essas atualizações abordaram as questões levantadas pelos avaliadores, afirmaram os fundadores. Bongiorno se referiu às avaliações e feedback como “um presente que recebemos”. Empresas estão interessadas no dispositivo, acrescentou.

Dois dias depois do lançamento, mais de mil empresas, incluindo do setor varejista, de medicina e de educação, entraram em contato para discutir a possibilidade de colaboração ou desenvolvimento de software para o dispositivo, afirmou Bongiorno.

A Humane também firmou acordos com operadoras de telefonia móvel para expandir o AI Pin para a Coreia do Sul e o Japão.

Algumas conversas, incluindo com a HP, evoluíram para negociações sobre uma possível venda, bem como a respeito do licenciamento da tecnologia da Humane, de acordo com três fontes familiarizadas com a situação. As negociações levaram Chaudhri e Bongiorno a contratar a Tidal Partners, que havia assessorado a Cisco em sua recente aquisição da empresa de segurança cibernética Splunk, por US$ 28 bilhões.

Essas negociações prosseguiram enquanto a Humane lidava com a descoberta de que um fornecedor de baterias havia fornecido componentes que poderiam representar risco de incêndio. Na quarta-feira, a empresa solicitou aos clientes que interrompessem o uso do estojo de carregamento enquanto busca encontrar um novo fornecedor.
Fontes próximas à empresa afirmam que a Humane tinha recursos suficientes para lançar seu dispositivo, mas estava tentando arrecadar mais.

“Só queremos construir”, analisou Bongiorno.

“Temos que ver a melhor forma de financiar isso”, acrescentou Chaudhri.

NYT: ©.2024 The New York Times Company

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